segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Alguém que nunca tive



   

    Acordo assustado nessa madrugada. Limpo os olhos e olho para o lado para ter a certeza que estou acordado. Mais uma noite de terror. Outro sonho de outro mundo, maluco e insano, que acabará por tomar a minha cabeça o resto do dia. Afasto os cobertores e sinto o suor da minha pele, e a minha respiração ofegante. Esses meses tornaram-se excessivamente difíceis conviver com esse medo que corroi-me por dentro. (Por isso peguei em uma folha de papel e uma caneta bico fino, que me foi oferecida pelo meu avô, e começo a escrever). Esses pingos de tinta, ligeiros borrões no papel, tranformam-se em frases.


De : ----------
Para : Alguém

    Três anos se passaram. Três longos anos. Não tenho muita coisa para contar durante esse tempo. Mas hoje senti-me na nescessidade de escrever. Estou levando a minha vida. Trabalho, estudo, e sou tudo aquilo que querias que eu fosse. A minha casa é confortável, tenho um carro só para mim, e bastante dinheiro na conta-corrente. Estou feliz. Na verdade é dificil saber o que é a felicidade. Mas tu ensinaste-me que ser feliz é ter tudo aquilo que sempre sonhamos, porém acho que esqueceste-te de explicar o que faço depois de conseguir a minha felicidade baseada em pequenos objectos, de que nada valem para alimentar a minha alma e atenuar meu coração. Esquecestes de falar que a felicidade é ter também todas as pessoas do seu lado, a apoiar-te, amar-te. Como tinha dito antes : " É difícil saber o que é felicidade ".
    Estão várias coisas a passar pela minha mente nesse momento. Coisas que já acabaram mas arranjaram um geitinho de ficarem cá guardadas, embrulhadas na caixinha encarnada e impregnadas na memória. Sinto muitas saudades daqueles tempos, correndo por entre a relva alta, de tardes inacabáveis à frente da lareira a comer os seus chocolates. Lembro-me particularmente de uma cena : Nós dois no sofá, encolhidos e quentes em um cobertor grosso, passei a mão pela sua barba, dei um beijinho molhado de chocolate na sua face e fechei os olhos. Apenas a memória de ter-te tido ao meu lado é acolhedora. Usei essa cena em quase todos os meus livros e como inspiração para os meus poemas. Sinto a sua falta. Sinto falta do seu carinho matenal e a doçura dos seus lábios que se moviam no ritmo das estórias, ora cheias de acção, de heroísmo, ora cheias de paixão, tristeza e finais felizes. Hoje para mim, é um mundo totalmente diferente onde nem sempre tenho braços fortes para me sustentar, onde nem sempre tenho aquela voz que orienta-me e aponta o caminho. Tem de ser eu. São as minhas escolhas. Os meus erros.
    Acho que esse é o problema de tornar-se adulto. Seja onde estiveres, Essa carta vai encontrar-te. Talvez voando como fumaça pelas nuvens até atravessar os muros do além. Ou talvez ela mergulhe nos labiríntos do submundo, onde essas palavras hão de amenizar o teu sofrimento. Amo-te. Para toda a eternidade.
                                                                                                  Com carinho e chocolate.

   (Terminei de escrever a carta, tapei o bico da caneta e coloquei fogo no papel.) As chamas consomem as letras e apagam todo o vazio em mim. Cada detalhe do papel branco-neve é elimidado pelas brasas. ( E assim, tudo se apagou, evaporou, dissipou o meu medo. O medo do Papão.) Agora deito-me, cubro-me com a coberta, vendo a neve cair lá fora. Passo a mão pela sua barba, dou um beijo em sua face e já estou a dormir.
 
Jordann Fel.
  

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Como explicar ?


Como explicar o quanto te amo ?
Se as palavras somem ,
e a mente se tapa,
o coração desvanece,
e fica tudo sem graça ?


Como explicar como te amo ?
Se a luz dos seus olhos,
me cativam e hipnotizam
(dorido e estranho), 
as minhas dores suavizam,
e as chagas cicatrizam.




Como explicar " O Porquê de te amar " ?
se o meu conhecimento, não passa do chão,
e para ti, sou um mero peão.
Seria como contar as gotas do mar,
e atravessar o oceano,
como ainda aceitar ...
Se o meu sentimento, não passa d'um engano ?




Jordann Fel.




domingo, 25 de outubro de 2009

Palavras ao Vento




    Ele sopra, sopra e sopra. Para além da minha janela apenas vejo vultos, rabiscos na claridade, passam de um lado para o outro, correndo, fugindo e escondendo. Deixam as ruas complectamente nuas e totalmente sem vida. E lá vai ele, destemido e arruaceiro, devastando tudo o que vê pela frente. Estou quieto, mudo e congelado nesse canto, nesse minúsculo espaço que me foi concedido, incapaz de me mexer, olho somente para fora da minha janela e contemplo toda a sua glória e toda a sua força sumptuosa. Os carros, os bancos, telhados, janelas e árvores, nada consegue resistir a sua violência, são apenas meros peões na frente de uma rainha imponente, e com um simples toque ou um simples acto são instantâneamente levados pelo seu poder e a sua fúria. As lágrimas já tomavam conta do meu rosto. Eu quero estar alí, quero viver todo aquele momento, sinto necessidade de estar simplesmente imóvel. No entanto não quero morrer, me preocupo demasiado com o futuro.
    Cheio de energia e voracidade acaba por destruir o que resta de um prédio, varre todo o chão da imundície e leva consigo os destroços de varias vidas. E a cada minuto que passa, mais a sua íra aumenta, a sua sede de sangue e a sua fome de destruícão. Ele olha para mim, pressente a minha presença a quase cinquenta metros de distâcia, e vem ao meu encontro. Mais lentamente do que o normal. Respirando calmamente. Quase cheio de graça. E se aproximou, beijou minha face, e sugou a minha dor. Fagulhas entram na minha carne e dilaceram cada milímetro desta, e o frio consola a minha alma enquanto olho para baixo e vejo um homem, um corpo pequeno e vazio, sujo e cheio de pecado. E pelo canal que me levava para cima precipitei, e finalmente, não senti uma grande fúria a me consumir, entretanto senti uma fraca brisa quente e sussurros ao pé do ouvido. E não olhei mais para trás. Para o norte voei, lendo essas palavras ... lendo essas palavras escritas na areia da praia que são somente e unicamente, palavras mumuradas ao vento.